Revista Internacional de Educación y Análisis Social Crítico Mañé, Ferrer & Swartz.

ISSN: 2990-0476

Vol. 3 Núm. 2 (2025)

 

Prática libertária borboleteante - contribuições anarquistas para docência

Práctica libertaria mariposeante - aportaciones anarquistas a la enseñanza

Butterfly libertarian practice - anarchist contributions to teaching

 

 

Rafael Moraes Limongelli

Universidade Estadual de Campinas - Programa de Pós Graduação em Educação, São Paulo, Brasil.

https://orcid.org/0000-0001-9911-0936

rafaelimao@gmail.com

 

Resumo

Os anarquistas desenvolveram diversas estratégias, procurando sistematizar as suas conceções de educação em diferentes momentos da história, com variações ​​entre divergências e convergências. Desvendar algumas pistas sobre o vasto campo da prática libertária nesta área, com enfoque no ensino, é o objectivo deste ensaio, no qual exploraremos o que poderia ser entendido como o gesto "borboleteante" enquanto atitude ética de professores e professoras em relação às tarefas educativas. "Borboletear" é um conceito que surgiu com Fourier e foi desenvolvido em vários momentos do pensamento anarquista, seja por Faure, Ferrer-Guardia, Pelloutier, as irmãs Soares, Pinho, Scherer ou Gallo; trata-se de um estado de constante mutação e contínua variação de formas, que não pode ser captado por metodologias baseadas em dogmas, ciência tradicional ou qualquer outro parâmetro muito rígido. É importante destacar, em termos gerais, que a educação e o trabalho têm estado associadas nas práticas anarquistas ao longo da história, e isso merece reflexão. Iremos apresentar algumas das experiências anarquistas importantes na história da filosofia da educação, para confrontar o pensamento de Scherer e Gallo, e uma possível prática libertária borboleteante.

Palavras-chave: Anarquismo, educação, ética, filosofia da educação, história da educação, pensamento crítico, revolução, revolução cultural, sociologia da educação, teoria da educação.

Resumen

Anarquistas han desarrollado diversas estrategias intentado sistematizar sus concepciones de la educación en diferentes momentos de la historia, con diversas divergencias y convergencias. Desentrañar algunas pistas sobre el abundante campo de la práctica libertaria en ello, centrándome en el ejercicio docente, es objetivo de este escrito, donde vamos a desarrollar lo que podría ser el gesto de mariposear como actitud ética de profesoras y profesores ante la tarea educativa. Mariposear es un concepto que surge con Fourier y se desarrolla en algunos momentos del pensamiento ácrata, ya sea por Faure, Ferrer Guardia, Pelloutier, las hermanas Soares, Pinho, Scherer y Gallo. El mariposeo es un estado de constante mutación y variación continua de formas, que no se deja capturar por metodologías basadas en el dogma, la ciencia o cualquier otro parámetro rígido. Cabe señalar, en términos generales, que la educación y el trabajo han estado asociados en las prácticas anarquistas a lo largo de la historia, y hay que reflexionar sobre ello. Trazaremos algunos esbozos de algunas de las más importantes experiencias anarquistas en educación, para encontrarnos con el pensamiento de Scherer y Gallo, y una posible práctica libertaria de mariposas.

Palabras clave: Anarquismo, educación, ética, filosofía de la educación, historia de la educación, pensamiento crítico, revolución, revolución cultural, sociología de la educación, teoría de la educación.

Abstract

Anarchists have developed diverse strategies, attempting to systematize their conceptions of education at different points in history, with varying degrees of divergence and convergence. Unraveling some clues about the abundant field of libertarian practice in this area, focusing on teaching, is the objective of this essay, where we will explore what could be understood as the "butterflying" gesture as an ethical attitude of teachers toward the educational task. "Butterflying" is a concept that emerged with Fourier and was developed at various points in anarchist thought, whether by Faure, Ferrer Guardia, Pelloutier, the Soares sisters, Pinho, Scherer, or Gallo; is a state of constant mutation and continuous variation of forms, which cannot be captured by methodologies based on dogma, science, or any other rigid parameter. It should be noted, in general terms, that education and work have been associated in anarchist practices throughout history, and this warrants reflection. We will outline some of the most important anarchist experiences in education, to encounter the thinking of Scherer and Gallo, and a possible libertarian practice of butterflies.

Keywords:  Anarchism, education, ethics, philosophy of education, history of education, critical thinking, revolution, cultural revolution, sociology of education, theory of education.

 

Educação como anti-método

Seguindo um caminho difuso, sem solução nem saídas pré-determinadas, não é possível escrever o método da educação libertária; ao contrário, nela encontramos indícios de uma constante mutação das práticas, com momentos de aglutinação de conjuntos de ideias e outros de disrupção e divergência nos caminhos a percorrer. Na apresentação do livro O futuro de nossas crianças e outros ensaios, editado pela Intermezzo em parceria com a Biblioteca Terra Livre, lemos:

Caberá, é claro, ao leitor e à leitora percorrer tão convidativo labirinto de pensamentos que nos mostram por onde é possível entrar, mas nunca apontam uma única, predeterminada e definitiva saída, pois as mesmas só existem quando construídas ao compasso daqueles que ousam, intransigentemente, caminhar em direção a liberdade para realmente sair do lugar. (Reclus et al., 2017, p. 33).

Sair realmente do lugar, deslocar o pensamento e a prática, colocar a si mesmo/a e aos/às seus/suas em constante interrogação, vasculhar entre as práticas e os meandros do pensamento: esses são os caminhos que nos conduzem à expansão das práticas e dos contextos de liberdade. Como publicou o Boletim da Escola Moderna de Barcelona: “Nisto consiste o verdadeiro método: ver, recriar e não repetir mnemonicamente” (Ferrer, 2014, p. 97). O verdadeiro método é um anti-método, que consiste em recriar e, portanto, é impossível de cristalizar.

Nieuwenhuis (2017) afirma que as pessoas descontentes são aquelas que buscam novos caminhos a percorrer, aquelas que dão sabor e sentido a tudo. As descontentes, as inquietas, as insatisfeitas, aquelas que não estão de acordo com as verdades cristalizadas que lançam um pó tóxico sobre as coisas vivas. Essas pessoas, que habitam os limites e as bordas, são as que podem saltar mais alto e abrir os caminhos da experiência e da descoberta do novo. Os processos de produção do conhecimento acontecem, em linhas gerais, por meio da experiência e da construção de verdades provisórias -verdades constituídas de maneira comunitária, desde baixo- que, em algum momento, servirão à revolta dos que estão por vir, das novas verdades que ainda virão. Conhecer é rebelar-se contra as verdades cristalizadas e provisórias de um determinado território e expandir as fronteiras das possibilidades de conhecer. “Antes de tudo, é preciso proclamar para a criança o direito de pensar, falar francamente, duvidar, ter sua opinião pessoal e também o direito à revolta” (Reclus et al., 2017, p. 53).

Para os anarquismos, a educação é parte da revolução permanente na qual todas estamos comprometidas. Para além das diferenças geracionais, colocar-se em processo de produção-compartilhamento de conhecimento, autogerindo os próprios processos de forma comunitária e escavando, no presente, espaços de liberdade e de experimentação coletiva, é uma pulsão essencial para adubar a revolta e as revoluções nos caminhos do aprender.

Neste artigo, desenvolveremos o que seria o gesto de borboletear como uma atitude ética do docente diante da prática educativa. Borboletear é um conceito que emerge com Fourier (2007) e que se desenvolve em alguns momentos do pensamento libertário, seja em Faure (2015), Ferrer y Guardia (Nascimento, 2025), Pelloutier (1900), nas Irmãs Soares (Tannús, 2006), em Pinho (2013), Schérer (2005) ou Gallo (2007, 2018; Gallo et al., 2021; Gallo & Limongelli, 2020). Borboletear é um estado de constante mutação e variação contínua das formas, que se esquiva de ser capturado por metodologias baseadas no dogma, na ciência ou em qualquer outro parâmetro rígido. Cabe destacar, em linhas gerais, que a educação e o trabalho estiveram historicamente associados nas práticas anarquistas. Por isso, este artigo oscila entre essas dimensões e, com esse propósito, traçaremos algumas linhas sobre as experiências anarquistas mais relevantes no campo da educação para, ao final, encontrarmo-nos com o pensamento de Schérer (2005) e Gallo (2007, 2018), e com uma possível reativação de uma máquina libertária borboleteante.05) y Gallo (2007, 2018), y con una posible reactivación de una máquina libertaria mariposeante.

Mutualismo

Em um texto publicado pelo Centro de Cultura Libertária de Almada (Portugal), encontramos uma análise contundente de Pelloutier (1900) sobre a propriedade privada e o valor de troca que o capitalismo impõe ao trabalho, atuando como definidor das desigualdades de classe. Trata-se do mesmo processo que condena uma parte da população à miséria e outra, minoritária, ao luxo. Entre essas duas classes, articulam-se uma série de polícias e milícias que garantem a estrutura por meio da violência:

Constituíram-se progressivamente as milícias, os exércitos, as magistraturas, a polícia, incumbidas de proteger o organismo social, os parlamentos, os ministérios, encarregados de os administrar. E como estas diversas funções custam caro sem produzir coisa alguma os pobres tiveram que redobrar seus esforços para satisfazer as necessidades dos parasitas (P. 10).

Em outro trecho, ao buscar elaborar como seria uma sociedade em que a troca e o mutualismo conformariam uma nova comunidade livre de opressões, escreve: “Comer e pensar, extrair da terra os frutos e do cérebro as ideias: tal deve ser a ocupação humana” (Pelloutier, 1900, p. 12).

Ao longo do texto, Pelloutier defende uma estratégia de luta e de ação conhecida como anarco-sindicalismo ou sindicalismo radical, articulada à existência das Bolsas de Trabalho e de uma Federação Internacional dessas Bolsas. As Bolsas de Trabalho foram espaços cedidos por alguns municípios franceses ao movimento dos trabalhadores organizados, fortemente inspirados nas ideias de mutualismo e federalismo de Proudhon (Dixon, 2012). Nelas, realizavam-se atividades de articulação sindical, centros de apoio a trabalhadores adoecidos, centros de formação e instrução, além de centros de auxílio a desempregados.

Na perspectiva de Pelloutier (1900), as Bolsas de Trabalho e sua Federação estavam a serviço de uma autogestão da produção em suas diversas formas — grãos, minérios, artes, entre outras — capazes de promover o intercâmbio direto entre trabalhadores/as e, assim, criar outra circulação da produção, fora do esquema de exploração do capitalismo e do mercado.

Entre a organização sindical que se elabora e a sociedade comunista-anarquista, no seu período inicial, há concordância. Nós queremos que toda função social se reduza à satisfação de nossas necessidades; o sindicato também o quer, esse é seu fim, e cada vez mais ele se emancipa mais da crença de necessidade de governos. Nós queremos o livre acordo dos homens; o sindicato só pode existir expulsando do seu seio qualquer espécie de autoridade e de coacção. Nós queremos que a emancipação social seja obra do mesmo povo, a organização sindical também o quer. (Pelloutier, 1900, p. 18).

Pelloutier foi secretário-geral da Federação das Bolsas de Trabalho entre 1895 e 1901 e um dos principais animadores das práticas de educação popular desenvolvidas nesses contextos. Financiadas por fundos de greve e por práticas mutualistas, as Bolsas de Trabalho organizaram numerosas ações diretas de educação popular.

As Bolsas de Trabalho tornaram-se, assim, centros destinados à educação e à discussão dos problemas que afetavam a classe operária. O ensino era conduzido pelos operários mais cultivados. Os serviços de ensino compreendiam: uma biblioteca, um escritório de informações, um museu social, cursos profissionais e cursos de ensino geral. (Cuevas, 2014, p. 101).

Por meio das Bolsas de Trabalho, fomentaram-se espaços essenciais para o cultivo da memória e da aprendizagem da filosofia libertária. Elas contavam com importantes bibliotecas anarquistas, com o Museu do Trabalho e com escritórios de informação e propaganda, que buscavam formalizar e preservar os documentos e notas emitidos pelas organizações de trabalhadores/as. Ficaram conhecidas como a universidade dos/as trabalhadores/as, onde se organizaram cursos formativos em diversos campos, das engenharias e das medicinas às artes.

Educação Integral

As proposições libertárias para uma educação antiautoritária articulam-se com o pensamento e a prática de Paul Robin (Moriyón, 1989), especialmente em sua tentativa de sistematizar a ideia de educação integral. Antes de se engajar nas lutas socialistas libertárias, Robin estudou para se tornar professor na escola formal francesa e exerceu a docência em instituições regulares, onde rapidamente se desencantou com o sistema de ensino tal como o conhecemos. Seu percurso libertário inicia-se com a mudança para Bruxelas. Em Genebra, conhece Bakunin (Cohn, 2008) no interior da Associação Internacional dos Trabalhadores e, no congresso de 1868, apresenta uma moção em defesa da educação integral, integrando o Conselho Geral até ser expulso juntamente com outros socialistas antiautoritários (Merbilhaá, 2023).

Enquanto aqueles que, há séculos, impõem seu domínio aos povos com a falsa promessa de torná-los felizes, brigam e lutam às custas de seus súditos e ainda desfrutam à custa de seus bolsos, a minoria inteligente dos trabalhadores, totalmente desiludida, compreende-se, organiza-se e reverte ativamente a corrente de decadência na qual os déspotas precipitam a humanidade. Há quase cinco anos […] proletários de todos os países vêm se unindo em Associação Internacional. (Moriyón, 1989, p. 92).

Em sua luta internacionalista pela emancipação dos povos, dos/as pobres e dos/as trabalhadores/as, Robin defendeu sempre que a educação deveria ser uma estratégia essencial para a revolução social — uma revolução capaz de inaugurar uma sociedade fundada na igualdade.

Por conseguinte, em nome da justiça, queremos, para todos, uma educação completa, integral. Apenas aqueles que partem do velho princípio teológico podem classificar os homens em duas castas: os que trabalham e os que se divertem, os que obedecem e os que mandam. A justiça não pode legitimar a desigualdade! (Moriyón, 1989, p. 89).

Com o apoio do prefeito da cidade de Cempuis, familiarizado com suas ideias, Robin foi convidado a dirigir o Orfanato de Cempuis, função que exerceu entre 1880 e 1894. Em Cempuis, pôde desenvolver uma das primeiras experiências duradouras de educação anarquista com crianças e jovens: foram quatorze anos de prática libertária. O orfanato acolhia cerca de 150 crianças e adolescentes, internados/as por diferentes razões, que iam desde sanções disciplinares até a ausência de tutores/as ou questões que hoje associaríamos ao campo da saúde mental.

Robin promoveu deslocamentos radicais nos modelos educacionais de seu tempo: descentralizou o ensino religioso em favor de uma educação racional e científica; afastou-se das teorias de aprendizagem baseadas na memorização de verdades estabelecidas; e aprofundou um modelo de ensino voltado aos meios de produção do conhecimento. Para o horror da sociedade patriarcal da época, defendeu ainda uma educação mista, com meninas e meninos aprendendo juntos/as. Robin concebia a educação como um processo transversal ao desenvolvimento das capacidades físicas, morais e intelectuais.

As atividades físicas em Cempuis ocupavam pouco mais de um terço da jornada diária. Incluíam natação, equitação e ginástica — em um ginásio equipado com diversos aparelhos — além de jogos e atividades ao ar livre. A alimentação era inteiramente vegetariana, pois Robin acreditava que essas práticas nutriam de forma integral o corpo, a mente e a comunidade.

As atividades intelectuais, manuais e artísticas organizavam-se segundo os interesses de cada grupo de educandos/as, orientados inicialmente à descoberta, por meio da observação do entorno — a natureza, a cidade, a sociedade, a escola, as fábricas, os fenômenos — dos temas que lhes despertavam curiosidade. Em seguida, passavam à experimentação prática desses interesses, avançando para processos de investigação teórica e experimental em laboratórios, estudos de campo e leituras coletivas. As possibilidades de descoberta vocacional permaneciam sempre abertas, sem distinção de gênero. A partir dos doze anos, incentivava-se que os/as jovens experimentassem alguma profissão por, ao menos, três horas diárias. Cempuis contava também com uma gráfica, onde se ensinavam técnicas de editoração e tipografia.

As atividades morais buscavam fundar uma nova ética, distante da moral burguesa e religiosa. A moral libertária inspirava-se nos ideais de Kropotkin de solidariedade humana e apoio mútuo (Skyer et al., 2025). Dois aspectos eram centrais para o cultivo dessa nova moral: de um lado, o modo de vida e a gestão coletiva da escola; de outro, a escolha dos conteúdos e teorias ensinados, abolindo quaisquer ideias impregnadas de religiosidade ou de capitalismo.

A organização da escola de Cempuis procurava colocar todos os membros da comunidade — professores, alunos, direção e trabalhadores — em um plano de igualdade: todos deveriam respeitar-se mutuamente, e a liberdade de cada um era considerada fundamental para o bom desenvolvimento dos estudos. A relação entre professor e aluno baseava-se na discussão e na pergunta, buscando fazer com que a criança desenvolvesse seu espírito crítico e sua autonomia, e nunca a submissão. (Gallo, 2007, p. 87).

Gallo (2007) relata que, em Cempuis, as atividades das crianças eram mediadas também por objetos experimentais, como balanças, lupas, barômetros, pinças, termômetros, telescópios, entre outros. Por volta dos dez anos, começavam a participar das oficinas, que ofereciam ofícios como sapataria, tipografia, encadernação, forja, carpintaria, costura e lavanderia. A rotina das crianças até os treze anos — quando concluíam o ensino primário — era composta por nove horas diárias, sendo cinco dedicadas aos trabalhos manuais (oficinas e trabalhos coletivos) e quatro à educação formal (aulas e leituras).

Após o término do ensino primário, ingressavam no período de borboleteamento, durante o qual passavam a circular cotidianamente entre as diferentes oficinas — madeira, metal, forja, costura, tipografia, gráfica, serviços gerais. Depois dessa fase experimental, os jovens escolhiam o campo no qual desejavam se aprofundar, com a possibilidade sempre aberta de mudar de ofício: uma pedagogia da liberdade em movimento.

Nem isso, nem aquilo

A biografia de Sébastien Faure (1858–1942) é profundamente singular (García; Garay, 2024). Participou de inúmeros contextos de militância, foi julgado no Processo dos Trinta, dirigiu o periódico Le Libertaire e dedicou sua existência a viajar pelo mundo realizando conferências sobre os princípios libertários, que financiaram, em parte, a experiência comunitária d’A Colmeia (La Ruche).

N’A Colmeia coexistiam diferentes formas de participação das crianças: algumas viviam na comunidade, enquanto outras frequentavam o espaço diariamente e retornavam às suas famílias. Ali realizavam jogos, aulas, ofícios e múltiplas atividades. No entanto, Faure insistia que A Colmeia não deveria ser definida como uma escola: “A Colmeia não é, pois, nem uma escola, nem um internato, nem um orfanato” (Faure, 2015, p. 50).

Financiada por recursos provenientes de organizações operárias de diversas partes do mundo, por doações das famílias (quando possível), pela venda de materiais e produtos elaborados no interior da comunidade, por assinaturas dos periódicos publicados e por contribuições arrecadadas nas conferências internacionais de Faure, A Colmeia existia fora das lógicas do público e do privado, da escola e do orfanato. Essa condição a colocava em constante fricção com as autoridades estatais — algo que não parecia inquietar Faure: “A situação continua a mesma: o legislador ignora A Colmeia e A Colmeia ignora o legislador. É simples, franco, claro e preciso” (Faure, 2015, p. 56).

Em sua organização interna, praticava-se um horizontalismo radical. Ainda que houvesse funções diferenciadas — direção, docência, trabalho técnico, administração — as decisões eram tomadas coletivamente em assembleias abertas a todas as pessoas interessadas. Trata-se de “vida em plena luz, confiança absoluta, troca simples e franca de opiniões, de coração aberto. É o meio mais seguro e eficaz para impedir intrigas e a formação de panelinhas baseadas em segredos e silêncios” (Faure, 2015, p. 64).

Faure assumia o papel de diretor apenas nas questões externas — acordos com instituições, credores ou interlocutores públicos —, mas, no interior da comunidade, dissolvia essa posição: “Com os grupos e companheiros, o diretor se coloca ao lado de seus colaboradores e se reintegra ao grupo, deixa seu cargo e se torna apenas mais um, nem mais nem menos” (Faure, 2015, p. 58).

A gestão dos recursos internos também se dava de forma autogestionária. Os colaboradores partilhavam um caixa comum para despesas pessoais:

Todos têm acesso, não obstante, a uma pequena quantia de dinheiro próprio; existe para esse fim um caixa comum, do qual podem retirar o necessário sem prestar contas, sendo eles mesmos os únicos juízes de suas necessidades. Sinto-me feliz em dizer, como elogio a todos, que, após quase dez anos de existência d’A Colmeia, todos os nossos colaboradores utilizaram o caixa comum com absoluta discrição e reserva, procurando pesar o menos possível sobre o nosso orçamento. (Faure, 2015, p. 62).

A organização das crianças baseava-se em um critério objetivo: pequenos/as, médios/as e grandes. A distribuição nesses grupos relacionava-se às capacidades e aos desejos de cada grupo para realizar diferentes tarefas. Em linhas gerais, os/as pequenos/as dividiam seus dias entre o brincar, algumas aulas e atividades de cuidado da casa (descascar legumes, limpar, etc.). Os/as médios/as alternavam entre atividades lúdicas, oficinas manuais — inspiradas no borboletear de Robin —, aulas e leituras livres. Já os/as grandes dedicavam seu tempo ao ofício escolhido, participavam voluntariamente das aulas e, se desejassem, podiam integrar-se à gestão comunitária ou ao ensino dos médios/as e pequenos/as.

A educação deve ter por objetivo e por resultado formar seres tão completos quanto possível, capazes de ir além de suas especialidades cotidianas quando as circunstâncias ou as necessidades o permitam ou o exijam: os trabalhadores manuais, de abordar o estudo de um problema científico, de apreciar uma obra de arte, de conceber ou executar um plano, até mesmo de participar de uma discussão filosófica; os trabalhadores intelectuais, de pôr a mão na massa, na fábrica ou nos campos, com um papel digno e um trabalho útil. (Faure, 2015, p. 109).

A Colmeia empenhava-se em envolver a comunidade em sua vida cotidiana e, ao mesmo tempo, realizava viagens para conhecer outros lugares. Essas ações afirmavam que a escola e a aprendizagem não são ilhas desconectadas da sociedade nem da natureza. A educação proposta por Faure constituía-se como uma prática de autoformação coletiva, na qual cooperavam sindicatos, associações, cooperativas, famílias, artistas e todos aqueles que quisessem participar da criação de novas formas de vida.

O que era produzido nas oficinas — marcenaria, forja, confecção, cadernos, alimentos — sustentava economicamente a experiência escolar, enquanto as publicações eram distribuídas em diversos contextos da luta operária, garantindo uma parte fundamental do financiamento. A Colmeia convidava outros grupos e associações a experimentar modelos alternativos de educação popular.

Anualmente, organizava-se um festival n’A Colmeia, que reunia camaradas de diferentes partes do mundo. Entre corais, leituras de poesia, música e comidas, compartilhava-se a alegria da experiência comum:

Todo mundo leva, em seus pulmões, uma provisão de ar puro e vivificante e, em seus corações, a alegria e a emoção por muito tempo. Essa grande celebração oferece àqueles que nunca viram A Colmeia a oportunidade de visitá-la detalhadamente e, aos que já a conhecem, o momento de reencontrar o ambiente onde crescem nossas queridas crianças, que são também um pouco suas, e de constatar o contínuo desenvolvimento da obra. (Faure, 2015, p. 138).

Para além desse movimento de abertura para fora, as crianças d’A Colmeia viajavam sempre que possível para outros contextos e paisagens, seguindo os conselhos de Reclus (Ferretti, 2014) e aprendendo a geografia do mundo com seus próprios corpos. Essas travessias afirmavam outra concepção pedagógica: não se tratava de “estudos do meio” para ilustrar conteúdos previamente definidos, mas de experimentar o novo antes de pensar sobre ele — uma pedagogia da sensibilidade e do descentramento.

Que as fronteiras de seus jovens corações se ampliem sem cessar e se habituem a abraçar, em um mesmo sentimento de fraterna solidariedade, todos aqueles que, sejam quais forem a terra em que vivam, as vestes que usem ou a língua que falem, aspirem à emancipação universal. (Faure, 2015, p. 148).

Transdisciplinar e compartilhada

Maria Angelina Soares e Maria Antonia Soares, conhecidas como as Irmãs Soares, nasceram em uma casa simples do bairro da Mooca, em São Paulo. À época, o bairro era uma mistura de polo industrial e zona rural: ainda afastado do centro da cidade, concentrava fábricas e oficinas de diferentes portes. Segundo Ludmila (2021), “a casa da família Soares era um ponto de encontro educativo (Universidade Popular Racionalista) e sindical (União dos Sapateiros)” (p. 15).

Oriundas de uma família de militantes anarquistas, é provável que Maria Antonia Soares tenha estudado em uma escola libertária entre os oito e os doze anos, em Rosário (Argentina), onde seu irmão — perseguido pela polícia de Santos — atuava como professor. Ludmila (2021) destaca uma menção de Juana Buela (p. 20) a um Centro Feminino de Jovens Idealistas criado em São Paulo, ressaltando a importância desses centros para o impulso da emancipação das mulheres e da sociedade como um todo.

No início do século XX, bairros como Mooca, Brás, Belenzinho e Bom Retiro atravessavam profundas transformações. O protagonismo libertário, antes concentrado no Bom Retiro e no Brás, expandiu-se para novas zonas operárias — Mooca, Ipiranga e Lapa — próximas às linhas de trem, às fábricas e às moradias dos trabalhadores. Nesse contexto, em 1913, foi fundado o Centro de Jovens Idealistas, que apresentou o seguinte programa (publicado em 1915 pelo jornal Grito Operário e, em 1920, por A Plebe): reunir o maior número possível de mulheres; fomentar relações estreitas e amistosas entre elas em busca da emancipação; criar escolas gratuitas para jovens; fundar bibliotecas e publicações; e organizar conferências e festivais (Ludmila, 2021, p. 147).

Cabe destacar que, no jornal A Lanterna (julho de 1913), em sua contracapa, o Centro era descrito como um espaço de “propaganda em favor da emancipação da mulher, isto é, de libertá-la da escravidão em que se encontra e colocá-la no lugar que lhe corresponde na sociedade” (Ludmila, 2021, p. 146).

Esse Centro reuniu numerosas mulheres em torno de temas diversos, teve papel central durante a greve geral de 1917 no Brasil e articulou múltiplas práticas públicas: publicações, manifestos, conferências e campanhas. Durante determinado período, organizaram uma escola dominical para mulheres, de caráter anticlerical e libertário, buscando, por meio da educação, fomentar a propaganda pela emancipação feminina e pela guerra social.

Antonia Soares (apud Ludmila, 2021) escreveu que “por meio de jornais, livros, folhetos, boletins, comícios, conferências etc., temos nos comunicado com o povo e com os trabalhadores, confiando-lhes nossas aspirações” (p. 54). A comunicação era concebida como uma ferramenta de enfrentamento às campanhas de desinformação e difamação que a burguesia acuada propagava contra os anarquistas, acusando-os de terroristas: “Sentiríamos muito, no entanto, que os trabalhadores, deixando-se seduzir pelo canto da sereia burguesa, caíssem na armadilha que os capitalistas lhes armam, o que os levaria ao mais completo aniquilamento moral, ao último degrau da escravidão moderna” (p. 55).

No interior do Centro Feminino de Jovens Idealistas, as mulheres trocavam e compartilhavam responsabilidades na organização das atividades públicas, operando por meio da autogestão. Segundo Ludmila (2021), “a não distinção entre quem realiza a edição, a tradução, a impressão e a distribuição é intencional, fazendo com que a militância anarquista seja uma prática transdisciplinar e compartilhada por um corpo editorial expresso em um conjunto de militantes” (p. 170).

Nas experiências de ativismo do Centro Feminino, percebe-se uma articulação profunda entre propaganda, educação e trabalho, acionadas por meio da publicação, da escola dominical e dos comícios-conferências. As mulheres frequentemente compartilhavam a autoria dos textos assinados coletivamente pelo Centro e repartiam as tarefas editoriais de forma rotativa, negando, assim, a divisão hierárquica do trabalho em suas próprias organizações. Além disso, promoviam campanhas de financiamento e articulavam práticas junto às escolas libertárias existentes em São Paulo, como as Escolas Modernas nº 1 e nº 2.

Troca perpétua

Uma conferência proferida por Adelino de Pinho em 1908, intitulada Pela educação e pelo trabalho e posteriormente publicada em folheto, marca de forma emblemática suas ideias. Acompanharemos aqui alguns dos pontos que o anarquista autodidata desenvolve em sua análise.

Adelino enfatizou uma educação fundada na abolição dos castigos e das recompensas, orientada à construção da solidariedade entre os pares: “Em todas as escolas, em todos os países e em todos os tempos, o trabalho saudável dependerá da absoluta exclusão de todo estímulo competitivo, sob qualquer forma ou máscara” (Pinho, 2013, p. 34).

Independentemente de uma criança adaptar-se mais ou menos à educação formal, realizando as tarefas com maior ou menor facilidade, devemos, de forma comunitária, ser solidários e solidárias com todas elas: “Logo, como conclusão, as crianças devem-nos merecer todo respeito, toda simpatia, todo o amor” (Pinho, 2013, p. 27). As diferentes maneiras de se aproximar do conhecimento — alguns com maior afinidade pelas artes e mais desafios nas matemáticas; outros com mais energia para as atividades físicas ao ar livre e mais dificuldades com leitura e escrita — não devem ser compreendidas como problemas de aprendizagem: “Há diversidade de tendências, simplesmente” (Pinho, 2013, p. 28).

É evidente a valorização do trabalho, do ofício, da manualidade, do fazer com as próprias mãos o trabalho e a luta. Pinho travou sua batalha contra a divisão do trabalho baseada na apropriação do conhecimento por uma classe em detrimento da outra, denunciando a desigualdade entre diplomados e operários. Incentivou aqueles que desejassem obter diplomas a fazê-lo — pois “faz parte de um jogo social” —, mas advertiu que não se deveriam cultivar burocratas: “Os trabalhadores devem esforçar-se, sim, mas em fazer de seus filhos bons trabalhadores manuais, hábeis em seus ofícios, capazes de viver trabalhando e lutando. O reino dos diplomados é o reino dos acomodados” (Pinho, 2013, p. 28).

Radicaliza sua perspectiva, amplamente inspirada no pensamento de Proudhon, ao valorizar o trabalho humano, a potência do corpo, dos braços, das obras que os trabalhadores inscrevem na terra:

O operário, com um cérebro para pensar, um coração para sentir, um braço para empunhar a ferramenta, é a unidade de valores morais que se impõe […] Seu braço, auxiliado pela inteligência, remove todos os obstáculos; rasga canais, perfura túneis, aplaina montanhas, cava lagos, sulca o oceano. E tudo isso se diploma! (Pinho, 2018, p. 29).

Pinho aponta uma inversão nas estruturas de valoração do trabalho ao afirmar que o trabalho mais valioso é aquele que retribui de forma mais direta à coletividade, devolvendo a energia que esta acaba de exercer sobre si mesma — o oposto do que valoriza o mercado capitalista de troca, que aposta que o trabalho mais qualificado individualmente deve ser também o mais valorizado individualmente (o engenheiro acima do pedreiro; o médico acima do enfermeiro, etc.). Em outro folheto, publicado em 1920, Pinho é implacável já no título — Quem não trabalha não come! — e constrói, à maneira de Pelloutier, uma explicação da lógica de exploração dos diplomados sobre os não diplomados:

Não há por onde escapar. O mundo é suficientemente grande e possui recursos suficientes para que todos empreguem sua atividade, seu esforço, suas faculdades de vida e de trabalho útil e necessário. Apenas para a casta parasitária de vadios inveterados e crônicos, de zangões da colmeia social que sugam o mel e deixam apenas os resíduos às abelhas fecundas e laboriosas, é que faltará terreno apropriado às suas habituais proezas e aos seus perniciosos hábitos de consagrada vadiagem. (Pinho, 2013, p. 65).

Afirmando que o mundo possui recursos e espaços suficientes para que todas e todos possam trabalhar e realizar coletivamente o trabalho de todos e todas, Pinho adverte:

Apressem-se, pois, em tomar lugar no imenso exército de trabalhadores. Se o sol, quando nasce, é para todos, o mesmo deve ocorrer com o trabalho que a todos beneficia e do qual muitos não participam. Lembrem-se de que quem não trabalha não come. (Pinho, 2013, p. 65).

É importante destacar que o trabalho ao qual Pinho se refere não corresponde apenas ao trabalho que o capitalismo oficializou como masculino — o das máquinas ou do campo —, ainda que seu texto seja passível de críticas quanto ao viés sexista, o que poderia render uma discussão à parte. Sua concepção de trabalho é ampla e envolve uma troca perpétua entre todos, todas, a natureza, as artes e as sensibilidades:

A vida é uma troca perpétua. O homem está em relação de reciprocidade com o meio natural e o meio social, com o universo inteiro e com seus semelhantes. Não nasceu unicamente para conhecer, mas também para agir. Alternadamente ativo e passivo, dá e recebe; toma ideias das coisas e depois põe suas ideias em suas obras. Entra em comunidade de interesses, de sentimentos, de pensamentos com os outros homens, utiliza-se do trabalho de outrem e, em seguida, exerce sua atividade em proveito próprio e em proveito de todos. (Pinho, 2013, p. 32).

Nessa ampla argumentação, Pinho indica a necessidade de uma troca constante de todas com tudo, uma abertura permanente às mutabilidades. Seja com aquilo que ele chama de meio individual, social, natural ou universal, percebem-se ressonâncias que podem ser lidas em diálogo com um pensamento ecosófico posterior (Limongelli, 2024). O que se afirma com clareza em seu texto é que conhecimento e trabalho se produzem no interior de uma comunidade de interesses e em uma troca permanente de todas com tudo e de tudo com cada uma, em um gesto permeável de atividade e passividade, como uma membrana transversal: “assimilar e produzir, compreender e exprimir, conhecer a verdade e realizar o útil, o bem, o belo; saber e trabalhar” (Pinho, 2013, p. 32).

Lembremos que, para Adelino de Pinho — e para uma parcela significativa do anarquismo enquanto corrente de pensamento —, a educação se dá pelo trabalho, através do trabalho e para o trabalho: um outro trabalho, distinto daquele que conhecemos e que vemos aprofundar-se em suas linhas de exploração. Um trabalho que contenha em si a troca perpétua com a terra, com os outros seres, com as sociedades, fundado na ajuda mútua e na solidariedade interespecífica e planetária. O trabalho compreendido como experiência em relação a um todo multiorgânico. “Não lutemos, pois, contra o trabalho, mas organizemo-lo de modo que ninguém deixe de trabalhar, de modo que o trabalho não seja um instrumento odioso de exploração, mas um instrumento de felicidade” (Pinho, 2013, p. 33).

Esse instrumento de felicidade é amplo e articula o trabalho no campo, na terra, na fábrica, nas cidades, nos teatros, nas telas, nas letras, nas ideias, nos mares — onde quer que haja ação humana em constante agenciamento com as forças sociais, ambientais e subjetivas: “Mas nem só de pão vive o homem. O homem necessita de livros, de música, de estátuas, de pintura, de paisagens. Logo, ao lado de um trabalhador, devemos formar um pensador” (Pinho, 2013, p. 33).

Autogestão, propaganda e estética

Selecionei essas experiências educativas por considerar que elas oferecem respostas potentes e sensíveis para a criação de um outro trabalho no interior das práticas libertárias de educação. As Bolsas de Trabalho, Cempuis, A Colmeia e o Centro Feminino de Jovens Idealistas produziram, no presente de suas práticas, transformações radicais nos campos do trabalho, da propaganda e da educação: primeiro, na forma de organização do trabalho no interior das próprias instituições, por meio da autogestão radical da administração e do conhecimento; segundo, na implicação entre a difusão do conhecimento extraescolar, por meio de campanhas populares de propaganda e de ações públicas; terceiro, no posicionamento ético-estético diante da divisão do trabalho, ativando o dispositivo do borboletear frente à serialização do trabalho.

A autogestão é, evidentemente, um conceito-chave para a leitura dessas quatro experiências. Por um lado, todas praticaram a autogestão em suas próprias formas de organização, tensionando diferentes sentidos do que chamamos divisão do trabalho. Por outro, tematizaram a autogestão em suas formas de produção do conhecimento, seja nas práticas escolares, nas publicações, nos comícios ou na propaganda das ideias anarquistas de autogestão. As Bolsas de Trabalho se articulavam em torno de uma federação descentralizada e mutualista, autogerida pelos sindicatos libertários. Funcionavam por meio do intercâmbio de produtos de diferentes naturezas, mantendo uma circulação fora do mercado capitalista. Sua gestão, sustentabilidade e organização eram realizadas por trabalhadores/as e para trabalhadores/as, sustentando de forma emblemática uma radicalidade frente à divisão do trabalho e criando espaços nos quais todos/as aprendem e ensinam coletivamente, independentemente de suas posições no mundo laboral, intelectual, manual ou artístico.

A Colmeia operava um sistema de autogestão administrativa e educativa aberto a todas as pessoas que integravam o processo: trabalhadores/as da manutenção, cozinheiros/as, jardineiros/as, agricultores/as, professores/as, diretores/as, estudantes e comunidade. Na narrativa de Faure, tratava-se de um espaço aberto, no qual falar livremente ampliava a confiança mútua. Assim, a solidariedade e o apoio entre as pessoas fomentavam uma nova forma de educação e de vida. A Colmeia, que não era orfanato nem escola, pode ser compreendida como um território educativo autogerido. Toda a produção coletiva d’A Colmeia — os trabalhos agrícolas, os de costura, a venda de periódicos ou as festividades com apresentações artísticas que garantiam recursos constantes para a escola — era realizada por todas as pessoas envolvidas: estudantes, docentes e trabalhadores/as. Um trabalho produzido por todas, gerido por todas, compartilhado para todas e que educa a todas.

Muitas vezes, não é possível identificar as autorias dos comunicados e manifestos do Centro Feminino de Jovens Idealistas, pois muitos deles foram escritos por meio de um trabalho coletivo que, ao autogerir seus próprios meios de comunicação, aboliu a divisão do trabalho entre as mulheres. Autogestão como prática de ensino mutualista, na qual todas ensinam e aprendem em fluxo contínuo umas com as outras.

A propaganda do sistema é o lodo do negócio — o lodo tóxico das barragens que destruíram Brumadinho e Mariana[1]. A propaganda é o barro intoxicado da obediência, do consumo, do servilismo, da violência e da apatia. Um barro espesso e pegajoso que se infiltra por todo o campo social: os modos de comer, de dormir, de amar, de rezar, de sorrir, de produzir. Por meio da propaganda do capital, do Estado, da igreja e das corporações, moldam-se os desejos, as condutas e as práticas. Os/as anarquistas sempre estiveram atentos/as a isso, como adverte Antonia Soares (Tannús, 2006) sobre a atenção necessária ao canto da sereia que conduz a embarcação operária contra os arrecifes.

As Bolsas de Trabalho dedicavam-se amplamente à sustentação de uma cultura libertária por meio da criação de bibliotecas anarquistas, museus do trabalho e diversos arquivos, onde se armazenavam panfletos, jornais, comunicados, normativas e instruções. Convém lembrar que a biblioteca e o museu diferiam profundamente do que hoje compreendemos como espaços atomizados de consumo individual da arte, como as megaexposições contemporâneas. A biblioteca libertária funcionava como espaço de encontro e de ensino mútuo, com leituras coletivas em voz alta para companheiros que iniciavam seu processo de alfabetização, bem como grupos de estudo de temas diversos. Eram espaços de difusão do pensamento libertário — uma anti-propaganda capitalista. Cempuis e A Colmeia contavam, em suas instalações, com oficinas de tipografia, impressão e encadernação, onde se produziam livros, jornais, panfletos, cartazes e comunicados. Esses materiais eram elaborados por todos/as os/as integrantes das instituições — docentes, estudantes e trabalhadores/as — por meio de experiências de educação mútua em um sistema autogerido.

N’A Colmeia, essa prática alcançava importância e amplitude extremas, constituindo-se, inclusive, como um dos principais modos de financiamento da escola. Entre as oficinas, a única que produzia para fora, em direção a um mercado cooperativo, era a tipografia, que articulava um circuito de cooperação entre sindicatos, cooperativas, universidades populares, Bolsas de Trabalho, lojas maçônicas e grupos de vanguarda. Faure (2015) descreve esse circuito da seguinte maneira:

[…] os sindicatos, as cooperativas, as universidades populares, as Bolsas de Trabalho, as lojas maçônicas, os grupos de vanguarda, todos os amigos d’A Colmeia e também a multidão de companheiros que, individualmente, acompanham com interesse o desenvolvimento de nossa obra. (p. 121).

Para além do Festival Anual d’A Colmeia, com apresentações de teatro, dança, poesia, música, comida e bebida produzidas pela própria comunidade, realizavam-se comícios e conferências sobre educação. Durante o Festival Anual, um grande número de camaradas de diferentes localidades francesas reunia-se para celebrar a cultura libertária. A propaganda pelo fato — fazer escolas, comícios, greves, sindicatos, teatro, poesia, comida — era autogerida e distribuída por meio do compromisso direto daqueles que recebiam os materiais, que podiam, inclusive, tomar as coisas em suas próprias mãos e integrar-se aos meios de produção: uma leitora de um jornal que passa a compor sua redação, ou uma espectadora de uma peça que decide tornar-se atriz de um grupo libertário.

Existe uma voracidade capitalista em estabelecer os/as de cima e os/as de baixo. Os/as filhos/as dos/as de cima, como tradição familiar, estudam as ciências, a política, as indústrias e as engenharias, perpetuando a ordem do privilégio. Jovens bem alimentados/as, brancos/as e rosados/as, cultivam diversos saberes em escolas voltadas à formação intelectual desses/as futuros/as “nobres” proprietários/as do mundo: aprendem as formas de governo, de planejamento industrial, de militarização e de polícia. Os/as filhos/as dos/as de baixo, por sua vez, muito jovens, magros/as e maltrapilhos/as, dirigem-se às fábricas assim que suas forças permitem carregar algo, obedecer a uma ordem, ajudar na cozinha ou na limpeza. Desde cedo, aprendem a sustentar o trabalho com as próprias mãos, com pouco tempo para livros ou mapas. A vida imediata vai moldando sua vontade e sua vocação. Enquanto os/as de cima, como parasitas, saboreiam as porções mais suculentas do trabalho e do conhecimento, os/as de baixo são empurrados/as para os ofícios subordinados, recolhendo as migalhas do banquete burguês. Não há grande escolha de vocação, não há prazer. Faure (2015) expressa isso de forma contundente:

Sem dúvida, o operário que vai ao trabalho como escravo ao cativeiro não sente gosto nem aptidão por trabalho algum, sendo-lhe indiferente trabalhar nisto ou naquilo; tal é o destino que aguarda o triste aprendiz. (p. 97).

Há uma voracidade em distribuir a tristeza servil entre os/as de baixo, enquanto os/as de cima consomem a abundância do conhecimento e do trabalho. E há, com alegria, uma voracidade libertária em derrubar essa estrutura de reprodução da opressão por meio da educação. Trata-se de fazer tombar, ao mesmo tempo, a pedagogia da obediência e a economia do privilégio: não apenas criticar o mundo tal como está, mas produzir — na prática, na linguagem, nos corpos e nas instituições — outras condições de aprendizagem, outras formas de vida, outros modos de trabalho.

Borboletear

Uma máquina muito potente desenvolvida no pensamento de Fourier, e retomada por Robin, Faure, Schérer e Gallo, é a máquina de borboletear. N’A Colmeia, os trabalhadores instituíram uma resposta ética diante do procedimento de serialização da vida, criando um período de pré-aprendizagem que, nas palavras de Faure (2015), permitia que cada aprendiz “experimente diversos ofícios e cada um deles pelo tempo suficiente para estabelecer entre uns e outros as comparações necessárias, das quais ela [a aprendiz] é o centro” (p. 98). N’A Colmeia, as crianças podiam viver na comunidade até certa idade e, depois, partir livremente. Aquelas que permaneciam, ai estavam comprometidas com a comunidade por meio dos ateliês de produção que escolhiam, da socialização do trabalho e, por consequência, da educação dos/as mais jovens. No entanto, o gesto de borboletear entre diferentes experiências de trabalho, entre diversos ateliês, não serve apenas para encontrar a atividade que mais agrada ou que proporciona maior prazer, mas ativa também um processo educativo que articula corpo e mente. Segundo Faure (2015):

Ao mesmo tempo, prossegue seus estudos: não apenas porque está longe de ter adquirido a soma de conhecimentos gerais que, no futuro, seja qual for a profissão que exerça, lhe serão indispensáveis; não apenas porque já chegou a uma idade em que, com mais maturidade, aproveitará melhor os ensinamentos que lhe forem dados, mas sobretudo porque, trabalhando alternadamente, todos os dias, de modo regular, na sala de aula e no ateliê, estabelecerá, de maneira irremediável, ainda que sem o saber, uma relação muito útil entre seus trabalhos aqui e seus estudos ali; entre a formação de sua inteligência, de seu olhar e de suas mãos, entre sua cultura geral e seu aprendizado técnico. (Faure, 2015, pp. 98–99).

A argumentação de Faure nos ajuda a compreender, na prática, aquilo que Proudhon buscou projetar por meio de uma politécnica das aprendizagens. A multiplicidade de experiências que uma aprendiz pode atravessar, borboleteando entre ateliês e estudos de diferentes campos do conhecimento, organiza-se para produzir prazer e autonomia diante do trabalho. A partir dessas palavras de Faure, compreendemos também os processos contínuos de desdobramento do conhecimento, não apenas na escola, mas no próprio desenvolvimento da comunidade na qual se está inserido/a, alternando entre a produção direta e, simultaneamente, sua planificação e organização.

Gallo (2018), por sua vez, avançando no tema que aqui nos ocupa, descreve o anarquismo de Schérer[2] da seguinte maneira: “já não está ligado a reivindicações individualistas, mas é concebido no contexto de uma nova sociabilidade, gestada no mundo dilacerado de nossos dias, apontando para uma nova forma de comunitarismo, centrada na hospitalidade” (p. 800). Um comunitarismo que se afasta do pensamento anarcoindividualista de Stirner (Burns, 2024), aproximando-se de uma abertura ao/à outro/a, à hospitalidade: “elas formam um chamado a uma hospitalidade permanente, sem reservas e sem limites, de nossas casas, de nossas pátrias, de nossas almas, de nossos corpos” (Schérer, 2005, citado em Gallo, 2018, p. 800) — pensado como o/a imigrante, o/a estranho/a, o/a fora da ordem, o/a fora do mundo, o/a diferente.

A radicalidade do pensamento de Schérer parece impulsionada pelo agravamento das formas globais do capitalismo e pelas crescentes ondas migratórias provenientes dos países subalternizados — permanentemente em guerra e submetidos ao extrativismo — em direção aos países dominantes nos polos do capital. Essa abertura radical não configura um sistema no pensamento de Schérer, mas um gesto de errância que, como escreve Gallo (2018), “não é de modo algum sistemático; está mais próximo de uma errância criativa do que da construção de um sistema explicativo” (p. 800). Essa linha de errância constitui-se como gesto de seu anarquismo filosófico e se ancora no conceito de borboletear que Schérer encontra em Fourier: “foi em Fourier que encontrei sua melhor expressão: um estilo ‘ambiente e fragmentado’, correspondente à dominância da paixão chamada ‘alternante’ ou ‘borboleteante’: mover-se, mudar. Apenas fiz incursões, propus pontos, sem insistir” (Schérer & Lagasnerie, 2007, citado em Gallo, 2018, p. 801).

A hospitalidade associada ao borboletear conduz a uma radicalidade do conhecimento enquanto substância coletiva e compartilhada por todas e todos. Assim como os gestos de errância, o conhecimento não pode ser pensado por um/a só: trata-se de um pensamento coletivizado, sempre em movimento. O conhecimento se constitui nas errâncias entre uma pessoa, uma coisa, uma ideia, um instrumento, uma máquina, outras pessoas, outras ideias, entre tantas outras conexões possíveis.

Há aí, certamente, uma paradoxa criadora, mas ainda assim uma paradoxa na qual a ideia de criação coletiva foi abolida: “é absolutamente necessário ser si mesmo, e é isso o que se torna asfixiante. Esmagador. É preciso sair daí” (Schérer & Lagasnerie, 2007, citado em Gallo, 2018, p. 801).

Torna-se necessário, portanto, constituir-se em grupos e coletivos para a formação de um “si fora de si”: uma hospitalidade errante. A anarquia, para Schérer, é ausência de princípios — quaisquer que sejam —, inclusive de si mesmo/a. Para ele, “a ‘an-arquia’, a ausência de princípio[3], é justamente a possibilidade de saída da filosofia da consciência, lançando-nos muito mais na direção do outro do que na de nós mesmos” (Gallo, 2018, p. 803). Ou seja, até mesmo o princípio de uma consciência pré-estabelecida, anterior ao sujeito e que precisaria ser esclarecida (ou emancipada), constitui uma imposição de um modo subjetivo já fechado e acabado. Afirma-se, assim, uma consciência ativa na abertura às inquietações, por meio dos problemas e dos tremores que constituem o pensamento. Não há, de modo algum, recusa das organizações coletivas: segue válida a máxima de Reclus segundo a qual a anarquia é a expressão mais pura da ordem — mas não de ordens transcendentes ou impostas por um pensamento representativo, preconcebido e determinado, seja pela história, pela ciência ou pela divindade.

O pensamento acontece a partir das inquietações que as próprias ações errantes convocam nos encontros entre pessoas, coisas, modos, ideias e práticas. A educação estaria, então, no gesto constante de uma antipedagogia instituída contra o dispositivo pedagógico da modernidade, ativando uma prática em permanente mutação e variação, como escreve Gallo (2018) a respeito dos traços do antissistema na filosofia da educação de Schérer:

significa pensá-la não como sistema nem como proposição de uma forma de educar; ao contrário, significa pensá-la no âmbito da crítica, da denúncia de um estado de coisas perpetrado pela modernidade -o que o filósofo caracterizou como um dispositivo pedagógico- e no convite à construção coletiva de elementos que possam conectar-se e reconectar-se, produzindo novos panoramas, novas possibilidades. A educação pensada, vivida e praticada como devir e abertura. (p. 804).

Devir de abertura, hospitalidade radical, politécnica das aprendizagens, alternâncias no aprender, mãos e mentes articuladas em torno de uma máquina borboleteante que investiga, no interior dos anarquismos, a potência de uma troca perpétua (Pinho, 2013, p. 32) que o trabalho mantém com a vida. Em oposição às máquinas de extrativismo, exploração e subordinação, encontramos, nas práticas libertárias, a busca por um outro gosto pela vida — um gosto que se constrói no compartilhar, no receber, no oferecer e na articulação de comunidades livremente associadas por meio de pensamentos e experiências coletivas que procuram instituir uma partilha da vida comum. Retomamos, aqui, a perspectiva de Adelino de Pinho, que, desde sua visão anarco-sindicalista e autodidata, afirmou:

Alternadamente ativo e passivo, dá e recebe; toma ideias das coisas e depois põe suas ideias em suas obras. Entra em comunidade de interesses, de sentimentos, de pensamentos com os outros homens, utiliza-se do trabalho alheio e, em seguida, exerce sua atividade em proveito próprio e em proveito de todos. (Pinho, 2013, p. 32).

A alternância e a errância inauguram uma máquina libertária de borboleteios

Robin, Faure e Ferrer y Guardia, as Irmãs Soares, Pinho — que entrelaçam suas práticas no phylum maquínico da educação libertária — aprofundaram a noção de borboletear introduzida por Fourier. Borboletear é uma imagem do pensamento fourierista que implica um gesto de variação e de navegação entre elementos de modo pouco ordenado ou dirigido. Trata-se de uma navegação ativada por outra forma de pensamento, fora da racionalidade instrumental, talvez por meio do plano do sensível ou mesmo de um saber do vivo, como propõe Rolnik (2019). Esse gesto borboleteante desencadeia diversas proposições práticas e teóricas. É, ao mesmo tempo, um campo de experimentação sensível que abre espaços para a emergência do novo -daquilo que ainda não se conhece- e promove também um enfrentamento direto com a divisão social do trabalho, permitindo que cada pessoa integre, em suas próprias práticas, uma variedade de saberes, habilidades, experiências, fazeres e teorias.

Essa integração de elementos diversos favorece a disseminação, em toda a sociedade, da capacidade de gerir, produzir, pensar, criar, desenvolver e investigar. Essa máquina libertária borboleteante relaciona-se intimamente com as possibilidades de autogestão local e com o federalismo planetário sonhado pela via libertária. Para ampliar as forças da autogestão, é necessário que uma comunidade possa realizar, coletiva e também singularmente, a maior variedade possível de práticas, teorias, ciências, invenções, tecnologias, sensibilidades e criações estéticas.

O borboleteio foi também reintroduzido no pensamento anarquista por Gallo e Schérer em suas proposições. Considero que Gallo, por meio da leitura de Scherer, realiza uma amplificação do gesto borboleteante. Ele desloca esse gesto do plano estritamente prático -delimitado entre as funções da vida (indústria, pensamento, teoria, estética, etc.)- que havia sido tematizado por Robin, Faure e Ferrer y Guardia nos diversos ateliês e laboratórios instalados em suas escolas. Schérer e Gallo afirmam que o borboleteio é também um gesto cosmológico, um modo de produzir o pensamento e a vida, um modo de produzir a vida e a prática docente. Não apenas um programa transdisciplinar, no qual se aprendem diferentes ofícios, mas um pensamento transversal, no qual as fronteiras se apagam constantemente.

A hospitalidade radical em relação ao/à outro/a produz um efeito de errância. Na errância, alteramos as forças que operam em nosso território existencial quando abrimos as fronteiras para aquilo que está fora de nós: os/as outros/as, o/a outro/a, as coisas sem forma, entre outros elementos. Que esses pensamentos possam florescer em práticas docentes de voos borboleteantes.

Referências

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[1] Os desastres de Mariana (2015) e Brumadinho (2019), ambos ocorridos no estado de Minas Gerais, Brasil, foram provocados pelo colapso de barragens de rejeitos de mineração administradas por grandes corporações do setor extrativista: Samarco (controlada pela Vale S.A. e pela BHP Billiton) e Vale S.A., respectivamente. Esses episódios, considerados ecocídios em razão de sua magnitude e de suas consequências, liberaram milhões de metros cúbicos de lama tóxica, destruíram comunidades inteiras, contaminaram bacias hidrográficas como as dos rios Doce e Paraopeba e causaram centenas de mortes humanas, além de danos irreparáveis aos ecossistemas locais e aos modos de vida de populações tradicionais e ribeirinhas.

 

[2] René Schérer (1922–2023) foi um filósofo francês, professor da Universidade de Paris VIII (Vincennes–Saint-Denis), vinculado ao pensamento libertário, ao pós-estruturalismo e à pedagogia crítica. Sua obra explora temas como a hospitalidade, a infância, a utopia e a educação, dialogando com autores como Fourier, Deleuze e Guattari.

 

[3] Uma nota sobre a tradução: quando Silvio Gallo fala em ausência de princípios, refere-se à ausência de um fundamento único e incontestável. Trata-se daquilo que vemos presente em outras arquias, como os fundamentalismos teológicos, que implicam uma única verdade sobre a origem do Estado (Deus), ou os fundamentalismos burgueses, que sustentam uma verdade monolítica acerca da origem do Estado (a guerra de todos contra todos, o Leviatã, etc.). Nesse sentido, os anarquismos podem ser compreendidos como uma filosofia política que implica um questionamento constante de seus próprios fundamentos, deslocando seu fazer conceitual de um pensamento monolítico para um pensamento múltiplo ou perspectivista.